Não há tentativa de recapturar o som clássico do Metallica, e nem mesmo de realizar mais do que eles estão acostumados.
O Metallica já possui mais de 35 anos de carreira, mas passaram-se oito anos desde que eles lançaram o seu último LP, “Death Magnetic” (2008) – é o maior hiato de sua carreira. Seu décimo álbum de estúdio, intitulado “Hardwired… to Self-Destruct”, é o primeiro onde o guitarrista Kirk Hammett não participou do processo de escrita. Esse trabalho ficou a cargo somente dos membros fundadores. “Death Magnetic” (2008) foi um passo em falso na direção errada, consequentemente esse álbum é mais voltado para os valores da velha escola da banda. Como podemos notar, a auto edição ainda é um problema para o Metallica, uma vez que quase todas as músicas possuem cerca de 6 minutos ou mais de duração. Mais do que qualquer outro álbum desde o “…And Justice for All” (1988), “Hardwired… to Self-Destruct” é fortemente dominado pelo James Hetfield. Os riffs e as harmonias de sua guitarra são inconfundíveis e entregues com grande precisão. E, apesar de alguns pontos embaraçosos, esse álbum possui o seu melhor desempenho vocal desde o auto-intitulado registro de 1991.
Enquanto isso, a bateria do Lars Ulrich está inevitavelmente sólida – suas habilidades foram cruciais para a eficácia do repertório. O guitarrista principal, Kirk Hammett, também teve sua chance de brilhar em quase todas as faixas. Espero que em álbuns futuros eles deixem Hammett contribuir novamente com o processo de escrita. Com “Hardwired… to Self-Destruct”, o Metallica surge de forma inesperada, é uma coleção de dois discos demarcada não por um salto para o desconhecido, mas nos dias tranquilos de sua juventude, quase três décadas atrás, durante o período primordial do thrash metal, quando sua impulsividade equivalia a uma distorção imprevisível e vertiginosa. Como o “Death Magnetic” (2008), esse registro é um retorno autoconsciente à forma; a única diferença é que desta vez a banda soa como se estivesse realmente tentando e, ouso dizer, talvez até se divertindo um pouco. Quanto à espontaneidade em um nível mais amplo, não ouça o “Hardwired… to Self-Destruct” esperando por surpresas progressivas ou voltas inesperadas.
As doze faixas se enquadram em duas categorias: acenos desvairados para o “Ride the Lightning” (1984), do qual o primeiro disco é composto principalmente, e cortes medíocres que compõem a maior parte do segundo. Os destaques do LP – “Hardwired”, “Atlas, Rise!” e “Moth into Flame” – caem em um campo mais consistente e o carregam com maior fogo. A citada faixa-título pode ser um pouco genérica, mas é um thrash metal acelerado com bons riffs de guitarra elétrica. Embora tenha letras juvenis, nos dá um começo explosivo e um tanto quanto promissor. Musicalmente, é um verdadeiro retorno às raízes mais agressivas da banda. Em “Atlas, Rise!”, Hammett brilha ao conduzi-la através de ótimos riffs e solos de guitarra – uma mistura intricada de thrash metal e heavy metal. “Now That We’re Dead” é um perfeito triturador midtempo que fala sobre as quedas da humanidade. “Quando tudo é dor, pode ser que isso seja tudo o que sempre soubemos”, Hetfield grita. “Moth into Flame”, por sua vez, move-se através de um riff robusto enquanto explora o comportamento narcisista da sociedade.
Em seguida, “Dream No More” apresenta versos mais obscuros, além de vibrações misteriosas e arranjos dinâmicos que mais parecem uma mistura de “All Nightmare Long” e “Enter Sandman”. O primeiro disco fecha com a nota poderosa de “Halo on Fire”, canção que define a realidade de que cada ser humano é preenchido com o bem e o mal – uma balada com tons de guitarra mais limpos e intensos vocais. “Halo on Fire” é a peça mais longa do repertório, com pouco mais de 8 minutos de duração. No meio do caminho, a fim de manter sua atenção, ela apresenta um apropriado solo de guitarra. O segundo disco, em contraste, é quase indescritível, uniforme, desprovido de dinâmica ou nuance instrumental. O rugido maçante de “Confusion” é praticamente indistinguível do giro lento de “ManUNkind” ou “Here Comes Revenge”, enquanto o mainframe desajeitado de “Murder One” beira a incoerência. Desacelerando ligeiramente o ritmo, a mencionada “ManUNkind” apresenta inicialmente uma nota silenciosa e acústica. Quando os tambores retrocedem, um som mais caótico é rapidamente inserido.
“Here Comes Revenge” é uma das músicas mais tristes e angustiadas do álbum: “Pequeno túmulo, estou de luto, eu irei consertá-lo / Sonho com uma doce vingança, eu acabarei com você”. É basicamente uma camada espessa de metal que mostra o outro lado do Metallica, especialmente pela tensão rara do seu longo catálogo. Hammett abre e fecha a músicas com alguns ruídos de guitarra que, consequentemente, adicionam um sentimento extra às letras. Enquanto “Am I Savage?” mantém as coisas mais suaves e nos remete aos discos “Load” (1996) e “Reload” (1997), a penúltima faixa, apropriadamente intitulada “Murder One”, é ostensivamente uma homenagem para Lemmy Kilmister (ex-vocalista do Motörhead que faleceu no final de 2015). Felizmente, eles terminam o disco 2 com a estrondosa “Spit Out the Bone”, uma premonição galvanizante de um mundo arrasado pela ganância do homem. Aqui, podemos dizer que o Metallica está no seu auge artístico – é um thrash-metal por qualquer definição. Hetfield fornece rosnados e um tipo de performance vocal que não ouvimos desde o “Master of Puppets” (1986).
Movendo-se numa velocidade feroz, a música também possui um frenético e apertado trabalho de guitarra. Durante 7 minutos, o arranjo e a bateria se mantém excessivamente ferozes enquanto os riffs e solos de guitarra se superam. Algumas coisas nesse álbum não são tão essenciais, mas abaixo de suas falhas, é um bom material. A auto edição do Metallica é um ponto negativo e, embora seja um disco duplo, “Hardwired… to Self-Destruct” sente-se ligeiramente incompleto. Da mesma forma, a disparidade de qualidade entre as músicas mais exuberantes e animadas, em comparação com as mais simples e lentas, é muito evidente. Não se engane, “Hardwired… to Self-Destruct” é facilmente o melhor álbum do Metallica desde o autointitulado LP de 1991. Ainda assim, não consegue convencer os não obstinados o que exatamente buscamos do Metallica hoje em dia. Mesmo depois de ouvir várias vezes, não se pode afastar a sensação de que em 2016 bandas inspiradas por eles acabaram se tornando melhores. Ainda assim, o quarteto não poderia retornar em melhor hora: quando você abre as notícias e vê uma música do Metallica ganhando vida, não tem como esconder o entusiasmo.