A maior parte do “Lust for Life” é uma fascinante destilação do subconsciente de Lana Del Rey.
“Lust for Life” é um lembrete do quão cinematográfica a música da Lana Del Rey é. Entre arranjos melódicos e tensas narrativas, ela combina sua estética com artistas como The Weeknd, Sean Ono Lennon, A$AP Rocky, Playboi Carti e Stevie Nicks. Com longas 16 faixas, alguns podem se perguntar o que mantém o álbum tão bom. Mas o grande comprimento é usado a seu favor. Misturando um pop vintage com o hip hop, ela está no seu território habitual. Enquanto o álbum demora para engrenar, as melhores faixas compensam as pequenas falhas. Como mencionado, a produção é novamente embriagada pelo hip hop, mas decorada com referências dos anos 60. Além disso, seu estilo emocional foi atraído pela influência do rock dos anos 70 e do trip hop. Lana Del Rey nunca pareceu mudar a indústria, mas sempre foi uma artista genuína e singular. Sua atitude pouco convencional é retrata em suas letras e na forma de cantar. Tal como Adele e Amy Winehouse, ela sempre esconde uma história por trás de suas metáforas. Dito isto, “Lust for Life” é temperamental, atmosférico e misterioso. Como sempre, as melodias flutuam suavemente sob sons eletrônicos, paisagens cinematográficas e tons acústicos. Embora suas letras pareçam reflexões surrealistas, são ponderadas pela verdade que possuem.
De certa forma, “Lust for Life” apresenta um novo giro, mostrando uma América nebulosa e em luto. Ficamos instantaneamente extasiados quando “Video Games” surgiu seis anos atrás – era uma canção sincera, indiferente e artisticamente caseira. Del Rey não deu respostas fáceis, mas ainda assim fizemos todas as perguntas erradas. No entanto, é uma chatice refazer o discurso do “Born to Die” (2012) agora – uma conversa tão tediosamente limitada sobre um corpo de trabalho que provaria, nos próximos anos, ser extremamente rico. Desde a reedição drasticamente superior do “Born to Die” na forma de “The Paradise Edition” (2012), Del Rey não oscilou e nem se estabilizou. Em vez disso, ela entregou um trio de álbuns sombrios, densos e agnósticos. Cada palavra, cada suspiro, cada onda de violino foi aproveitada ao máximo. Ainda assim, mesmo para os convertidos, é muito fácil viajar para os buracos negros do universo da Lana Del Rey, onde Hollywood fica no centro de uma ruína glamorosa. Suas canções transbordam em seu aspecto mais mítico. Suas camadas de simbolismo podem ser desorientadoras, como imagino que ela pretende que sejam, encorajando referências cruzadas e leituras profundas do seu trabalho cinematográfico.
Mas “Lust for Life” sugere que no seu melhor e mais verdadeiro, a música da Lana Del Rey é maravilhosamente simples: uma voz, uma história, um significado. E esse álbum lhe apresenta como algo ainda mais interessante: uma grande contadora de histórias americanas. Duas coisas separam “Lust for Life” do resto do seu catálogo. Primeiro, aquele sorriso radiante na frente do mesmo caminhão da obra de arte do “Born to Die” (2012). Ainda mais estranho: a tracklist está repleta de convidados pela primeira vez desde que a conhecemos. Este seria o “álbum feliz” da Lana Del Rey, previram os fãs. Acontece que “Lust for Life” não é completamente feliz ou abertamente político, embora ela esteja reexaminando seu relacionamento com a América. Dito isto, é um registro de transição, documentando o resultado de uma profunda mudança de visão e o próprio processo de mudança. Talvez a mudança mais significativa aqui seja evidente na primeira faixa, “Love” – um hino granulado inspirado pelo rock dos anos 50 (e de longe o melhor single do álbum) onde ela muda o foco de sua própria luta interna para dirigir-se ao público diretamente. Com “Love”, ela mantém uma estética cinematográfica e dramática, mas com sons mais expansivos e atmosféricos. A produção se acumula perfeitamente enquanto os tambores do refrão lhe dão uma qualidade mais consistente.
Sua voz sonhadora está emparelhada com simples progressões de acordes, além de um ar de tristeza e tédio. A produção combina impecavelmente com o contexto esperançoso e romantizado das letras. “Você se prepara, se arruma todo / Para ir a lugar nenhum em particular / De volta ao trabalho ou à cafeteria / Não importa, pois é suficiente ser jovem e apaixonado”, ela proclama no refrão. Ademais, a influência dos anos 50 permeia através de cada segundo. As cordas doloridas e os tambores sobrecarregados exalam um sentimento retrô. O trip hop que elevou suas músicas mais conhecidas está ausente. Entretanto, “Love” ainda presta um verdadeiro e tocante tributo aos seus primeiros trabalhos. “Olhem para vocês, crianças, vocês sabem que são os mais legais”, ela canta de maneira tranquilizadora, renunciando ao seu papel de protagonista. Esse impulso em direção a uma compreensão comum do seu universo aparece mais obviamente em canções como “God Bless America – and All the Beautiful Women in It” e “When the World Was at War We Kept Dancing”, duas baladas folk reduzidas (a primeira inclui uma instrumentação fornecido pelo Metro Boomin, com tiros errantes pontuando o refrão). “God Bless America – and All the Beautiful Women in It” é uma ode para a irmandade em tempos que os líderes de Estado não parecem preocupados com os direitos das mulheres.
Ela contém uma guitarra sutil e vocais de fundo inspirados pelas baladas dos anos 90. Esses títulos podem parecer um pouco exagerados, mas também são totalmente sinceros – canções para descobrir exatamente onde diabos estamos agora. Há momentos no álbum que, embora menos bem-sucedidos em um nível puro de composição do que alguns dos trabalhos mais focados da Lana Del Rey, são destilações fascinantes do que sua música significa. Seguindo uma direção maior, “Lust for Life”, com The Weeknd, fornece um som maravilhosamente direto – um dream pop com discretas influências de hip hop e R&B. Em “Coachella – Woodstock in My Mind”, Del Rey participa de uma apresentação no festival de Father John Misty, avaliando o mar de coroas de flores na multidão enquanto desenha linhas em direção ao passado e futuro. É um reconhecimento doce e autoconsciente de toda a sua história – e isso antes do refrão irromper em um aceno incrivelmente gracioso para “Stairway to Heaven”. Sonoramente, é um trap que fala sobre ter bons momentos em festivais enquanto os Estados Unidos parece estar caminhando para uma guerra. As coisas ficam mais emocionantes na segunda metade do álbum, onde algumas canções possuem um teor político – “Beautiful People Beautiful Problems”, com Stevie Nicks, vê suas vozes entrelaçadas brilhantemente.
E se o primeiro verso do dueto com Sean Lennon em “Tomorrow Never Came” – com suas referências a Bob Dylan e Elton John – parece uma supersaturação de seu léxico repleto de símbolos, Del Rey se reinventa de novo na ponte: “A vida não é uma loucura, eu disse, agora que estou cantando com o Sean?”. É ao mesmo tempo hilário e surpreendente, e não consigo imaginar nenhum outro artista além dela sendo capaz de compor isso. Aqui, Del Rey e o filho de John Lennon refletem sobre a triste realidade do mundo sobre algumas melodias simbólicas dos anos 60. Ademais, há uma inegável vibração de rock clássico por toda parte. Mas as melhores partes do álbum são as mais simples – canções que não têm sucesso, na medida em que se concentram em seus mitos – e apresentam suas composições como poesia que pode se sustentar por si só. Há “Cherry”, uma cavernosa canção com um baixo paranoico e ecos inundados de tambores de trap – a alusão menos óbvia e mais eficaz da Lana Del Rey em direção ao rap (embora Playboi Carti e A$AP Rocky apareçam perdidos em “Summer Bummer”). Aqui, ela se torna um personagem diferente e mais obscuro. A guitarra e o tambor subjugado escorregam na escuridão.
Seu lirismo atingiu um novo nível de sofisticação, mudando de devastadoramente franco (“O amor verdadeiro é como não sentir medo / Quando você está diante do perigo”) para o mais abstrato e sensual possível. Ainda há visões de praias negras, rosas queimando, vinho e pêssegos, inexplicavelmente arruinados; tudo parece uma natureza morta e decadente. Mas de fato, “Summer Bummer” a leva completamente para o mundo do hip hop. Sua harmonia devidamente sinistra casou adequadamente com as linhas de rap. Em “13 Beaches”, uma trilha sonora de algum filme de Hollywood que se transforma em tambores narcóticos e na angústia alternativa dos anos 90, funde seu simbolismo e literalismo em poesia: “Foram necessárias 13 praias para encontrar uma vazia, mas finalmente é minha”. É ao mesmo tempo uma experiência vivida (escapar dos paparazzi por uma série de praias no verão passado) e uma meditação sublime. Seguindo por uma nota sombria, “13 Beaches” a encontra no seu estado mais vulnerável. É uma canção devastadora onde o piano e a orquestra contribuem para a fragilidade e vulnerabilidade das letras. E embora a longa seção intermediária do álbum pudesse se beneficiar de mais edições, Del Rey deixa as duas canções mais impressionantes e tematicamente essenciais para o final.
A balada “Change” consiste em nada mais do que Del Rey e um piano, ao contrário de sua tendência para fortes paredes de som. “Há algo no vento, posso sentir soprando”, ela canta, deixando esquemas de rima para trás. “Está vindo suavemente, nas asas de uma bomba”. É a sensação de algo acontecendo ao seu redor e dentro de você, antes de descobrir exatamente o que isso significa. “Change” é um simples movimento que aproveita o máximo do piano. Delicada e gentil, pode ser considerada o momento mais doce do álbum. E em “Get Free”, Del Rey entrega, finalmente, a grande missão do álbum: “Finalmente, estou cruzando o limiar do mundo comum / Para revelar meu coração”. Não é tanto uma revelação, mas uma promessa de que alguém está chegando, e quando ela canta claramente: “Este é o meu compromisso”, o sorriso atípico da capa do álbum se revela não como uma declaração de felicidade, mas um lembrete de que ainda vale a pena acreditar na vida. “Lust for Life” não é um material transformador, pois sua estética pouco mudou. Mas ela simplesmente lançou o seu álbum mais consistente, diversificado e interessante até a data. Em outras palavras, é um clássico disco da Lana Del Rey, mas com algumas reviravoltas fascinantes.