Embora existam fantasmas do soul tradicional encadeados através desse álbum, a produção é firmemente moderna.
Faz quase dois anos desde que Demi Lovato lançou o seu último álbum de estúdio, “Confident” (2015). Ao prometer seu disco mais maduro e honesto, ela conseguiu sua primeira indicação ao Grammy. Canalizando o R&B, Demi Lovato nos deu o primeiro vislumbre de sua nova era quando divulgou “Sorry Not Sorry”. Mesmo com apenas 25 anos de idade, a ex-estrela da Disney já provou ser uma força do pop contemporâneo. O seu novo álbum, “Tell Me You Love Me”, é pop no termo mais definitivo da palavra. Cheio de melodias infecciosas e sons modernos, o registro possui uma qualidade bastante cativante. Lovato finalmente nos apresentou uma coleção coesa inspirada pelo soul e R&B, com uma brilhante visão de sua trajetória profissional e pessoal. Neste álbum, além dos vocais incríveis, ela nos guia através dos altos e baixos de seus relacionamentos. “Tell Me You Love Me” pode ser sonoramente subjugado, mas garante que os seus talentos vocais tomem o centro do palco – seu soprano felizmente amadureceu ao longo dos anos. Liricamente, o repertório destaca sua força e vulnerabilidade apresentando uma montanha-russa emocional, que nos faz olhar para si com uma perspectiva completamente nova.
Suas lutas com a saúde mental e o vício estão bem documentadas neste momento, em grande parte porque ela falou sobre isso com transparência. Mas para Lovato, a maturidade musical se mostrou mais elusiva. Ela mergulhou em quase todos os gêneros pop adjacentes desde o vigoroso “Don’t Forget” (2008). Ela produziu dois álbuns de pop punk domesticado enquanto ainda trabalhava na Disney; “Unbroken” (2011) e “Demi” (2013), liberados após se recuperar de seu nadir público, inclinaram-se para um aspecto mais genérico. “Confident” (2015) foi um passo à frente ancorado por um hit contagiante – o ousado e bi-curioso “Cool for the Summer” – mas Lovato ainda se sentia como uma voz em busca de um material que faria justiça a ela. Com “Tell Me You Love Me”, ela finalmente se estabeleceu em um espaço consistentemente atraente: um R&B pedregoso e sedutor que é tão emocionante em silêncio quanto em plena explosão. Demi sempre foi uma artista mais guiada para baladas: “Skyscraper” foi seu primeiro hit “adulto”, e sua carreira pode ter tomado uma forma totalmente diferente se não tivesse sido lançada por “This Is Me”. Ela nunca teve medo de uma apresentação vocal estrondosa nos modos de Adele ou Kelly Clarkson, e duas dessas apresentações são as primeiras âncoras do “Tell Me You Love Me”.
A faixa-título é um apelo desesperado por afeto que gradualmente se transforma em uma declaração de amor próprio – um soul midtempo que apresenta um trabalho de produção de alto nível. Com entrega ligeiramente frágil, Lovato admite que precisa de um relacionamento amoroso para encontrar a felicidade. Uma canção mais profunda que mostra sua vulnerabilidade quando trata-se de relacionamentos. Introduzida imediatamente por um rico instrumento de metal, “Tell Me You Love Me” mostra perfeitamente a força dos seus vocais. Enquanto ela oferece outra performance preenchida com poderosas notas altas, os versos capturam sua atenção e o refrão atinge o auge da produção. A balada “You Don’t Do It for Me Anymore” é ainda melhor, uma canção sobre um fim de namoro dedicada aos antigos vícios da Demi Lovato, em vez de uma paixão antiga. Ela assume um significado diferente, embora meio devastador e revelador. Quando você se aprofunda nas letras, começa a perceber um tipo diferente de ruptura amorosa. Emparelhada com uma linha de violino, ela mostra o seu registro mais baixo antes de subir a grandes alturas no refrão. São duas canções impressionantes isoladamente, mas também têm um impacto estranho: não demora muito para ficarmos completamente exaustos.
É aqui que “Tell Me You Love Me” melhora em relação aos seus álbuns anteriores: dá-lhe espaço suficiente para vê-la de forma diferente. Há um pau para toda obra como a Kehlani por trás dessas gaitas, uma artista com a habilidade de fazer o hip hop e o R&B funcionarem em um contexto pop. O primeiro single “Sorry Not Sorry” – seu maior hit em quase meia década – é um número de R&B com influências de soul realmente desafiador. Aqui, Lovato expressa corajosamente a necessidade de autoelogios enquanto tenta se afastar de pessoas tóxicas. Ao longo da produção agressiva, que incorpora elementos de gospel, ela fornece uma completa gama vocal. Há poderosos vocais por toda parte, além de tambores, piano e sintetizadores. Ela realmente mostra suas costeletas vocais, subindo ao mais elevado nível que consegue. Quando você ouve o álbum na íntegra, bons momentos continuam aparecendo. Lenta, sensual e sedutora, “Ruin the Friendship” fala sobre sair de uma amizade e cruzar os limites sexuais com tal pessoa. É uma música infecciosa auxiliada por vocais mais despojados. “Seu corpo está tão lindo esta noite / Eu estou achando que é hora de cruzar a linha / Vamos acabar com a amizade / Fazer todas as coisas que imaginamos”, ela canta sob a melodia hipnotizante.
Além da insistente linha de baixo, “Ruin the Friendship” se beneficia de alguns trompetes. Depois da sequência de baladas, “Games” muda o ritmo com suas fortes vibrações de R&B e improvisos estonteantes. Direcionada a um garoto que não quer se comprometer, essa faixa possui vocais mais robóticos que introduzem uma onda de R&B típica dos anos 90. A balada midtempo “Lonely”, com participação de Lil Wayne, apresenta uma Demi Lovato mais vulnerável, particularmente no afiado refrão. Uma música temperamental com ondulados sintetizadores, que a encontra infeliz em seu relacionamento atual. A produção subjugada produz uma essência melancólica que acompanha sua voz perfeitamente. Demi Lovato e Lil Wayne formam uma dupla surpreendentemente boa. Você pode até começar a ouvir a influência do “Blonde” (2016), do Frank Ocean, escorrendo em músicas mais profundas e descontraídas como “Concentrate” e “Hitchhiker”. Dirigida pela guitarra e com um leve acompanhamento gospel, “Concentrate” contém letras bem sedutoras. É uma peça apaixonada com uma ligeira influência de country, onde Lovato se mostra submissa. “Amor, vou fazer tudo que você quiser / Me prenda como se eu fosse sua escrava”, ela canta no refrão.
Lindamente escrita, a midtempo “Hitchhiker” é influenciada pelo neo soul e liderada por linhas de baixo, guitarras, órgãos e vocais impecáveis. A mulher por trás dessas músicas se conhece bem o suficiente para controlar seus impulsos mais destrutivos, mas ela ainda não consegue evitar uma série de riscos românticos. Lovato também não se preocupa com os obstáculos em seu caminho: “Sexy Dirty Love” constrói um pré-refrão em torno de uma metáfora estendida, e “Daddy Issues” é incrivelmente espumante para alguém cujos álbuns recentes apresentavam relatos dramáticos do relacionamento com o seu falecido pai distante. Certamente, ela desencadeia seu lado mais divertido na despreocupada “Sexy Dirty Love”. Essa canção possui um senso de diversão e faz uma inesperada mistura de disco e funk. Uma peça cativante que permite mais algumas acrobacias vocais fora de série. “Você é minha nova obsessão / Abandone qualquer hesitação / Amor, seja meu novo vício / Me envenene lentamente com seu amor”, ela canta no pré-refrão. “Daddy Issues”, por sua vez, é cheia de instrumentos de metal e abre com uma hipnótica batida de tambor. Mais uma vez, Lovato usa influências do passado em sua vantagem, falando sem remorso sobre seu amor por um homem.
Além da produção moderna e inclinação sexual, há um aspecto pessoal no seu interior. “Você é o homem dos meus sonhos / Pois você sabe como partir / Mas ainda acredito que você mudaria por mim”, ela canta de forma otimista. Uma vibração mais lenta surge em “Only Forever”, outra canção que brinca com a ideia de namorar um amigo. Enquanto “Ruin the Friendship” é tematicamente sexual, “Only Forever” é mais crua e coloca os sentimentos sobre a pessoa em questão. “Cry Baby” abraça o soul retrô, ao passo que Demi Lovato oferece vocais mais robustos no refrão. Contém bons timbres de guitarra, ao longo dos quais nos levam diretamente para um solo na segunda metade. O refrão é definitivamente o destaque – tanto de forma lírica como melódica. Nesse álbum, Lovato está disposta a jogar fora um relacionamento platônico e dar um salto emocional com um estranho porque sabe que sempre pode confiar em si mesma. “Tell Me You Love Me” pode ser facilmente considerado o seu mais forte e coeso trabalho até à data. É um álbum rico em vibrações de R&B e soul, e um reflexo de quem ela é como artista. Possui um trabalho de produção que não pode ser negligenciado e mostra que vocalmente ela está ficando cada vez melhor.