Embora seja uma vitrine de sua voz, “Head Above Water” é sem inspiração e cai com frequência na mesmice.
Honestamente, eu acho que um dos aspectos mais curiosos da carreira da Avril Lavigne é o seu amadurecimento reverso. Ela escreveu músicas em grande parte adultas no “Let Go” (2002) e “Under My Skin” (2004), mas em seguida, entrou em uma fase pop punk no “The Best Damn Thing” (2007) e parte do “Goodbye Lullaby” (2011). Isso não quer dizer que a qualidade era ruim – a infusão jovial trouxe uma dose de energia que estava em falta – mas ainda assim, era estranho testemunhar sua letras inocentes e pungentes aos 17 anos e depois rapidamente se dedicar a canções como “Hello Kitty” e “Bad Girl”. Depois do álbum auto-intitulado, ela ficou fora do radar por seis anos – muito tempo para uma estrela pop – e ressurgiu com “Head Above Water”, um disco que aparentemente pede para ser levado a sério. Afinal, faz sentido ela se esforçar por uma mudança de imagem. Agora, aos 34 anos de idade, ela se divorciou duas vezes e preparou possivelmente o álbum mais mal recebido de sua carreira. Parece que é o momento certo para crescer e começar fazer música para os adultos que sua fã base se tornou, enquanto ela estava escrevendo “Girlfriend” e “Bitchin’ Summer”.
De certa forma, ela está mais uma vez criando um pop melódico e descontraído que resultou em sucessos como “I’m with You” e “My Happy Ending”. “Head Above Water” está repleto de drama e melancolia, e no meio disso, Lavigne não parece mais uma mãe que está desesperadamente tentando se dar bem com os amigos de sua filha adolescente. O problema é que não é assim que se amadurece. O repertório apenas fornece algumas harmonias corais, instrumentos clássicos e letras sobre pássaros voando para longe. É um processo orgânico que o ouvinte pode se relacionar e, apesar dos vocais agradáveis, “Head Above Water” infelizmente foi arruinado por letras básicas e sem sentido. Para seu crédito, a faixa-título é uma balada pop rock dramática inspirada por sua luta contra a doença de Lyme. O single também serviu para promover sua fundação que oferece recursos relacionados à doença. Inicialmente, ela começa apenas com sua voz e o piano. “Preciso manter a calma antes da tempestade”, ela canta no primeiro verso, antes de pedir no refrão: “Deus, mantenha minha cabeça acima da água, não me deixe afundar”. O refrão é um momento poderoso e encorajador, à medida que Avril Lavigne clama por sua vida sobre cordas pesadas e um aceno para o seu passado pop rock.
Nesse ponto, a bateria, os sintetizadores e a guitarra elétrica abafam o piano. As letras são sobre os dias difíceis que ela enfrentou nos últimos anos por causa da doença de Lyme. Embora possa se encaixar nos seus álbuns anteriores, “Head Above Water” é compatível com 2018. Uma canção emocionalmente carregada que, apesar de ser um pouco clichê, possui muitos pontos positivos. Conduzida por uma melodia de cortar o coração, as letras mostram que ela foi capaz de lidar com as adversidades. O assombroso piano e a orquestração proporcionam um pano de fundo deslumbrante para sua voz. Musicalmente, é uma reminiscência de faixas como “I’m with You” e “When You’re Gone”. Mas dessa vez, Avril Lavigne realmente luta por sua vida. Dito isto, “Head Above Water” já pode ser considerada uma de suas faixas mais pessoais até a data. Suas palavras são dramáticas, resilientes e cheias de determinação. Outro caso em questão: “Tell Me It’s Over” realmente possui uma melodia fantástica construída com apoio de uma seção de metais e um coral gospel, onde o alcance vocal da Avril Lavigne se eleva – e então nos deparamos com um refrão repetitivo criado especialmente para as rádios mainstream.
No entanto, este single fornece um retrocesso de soul inspirado por grandes cantoras como Aretha Franklin, Billie Holiday, Ella Fitzgerald e Etta James. Sua voz está profunda e emotiva como sempre, mas a produção é completamente diferente daquela que o público está acostumado. No refrão, ela acerta algumas notas sem qualquer esforço, enquanto o lirismo aborda um relacionamento instável onde ela está constantemente brigando com o seu parceiro. “Me diga que acabou, se realmente tiver acabado”, ela canta no refrão sobre a melodia edificante. O instrumental, por sua vez, é bastante old-school e vintage, embora lembre bastante “Love on the Brain” da Rihanna. “Tell Me It’s Over” permite que ela expanda seus horizontes e brilhe sob uma nova textura. Honestamente, eu nunca pensei ouvi-la acompanhada de trompas ou corais gospel. Mas a produção é simples – com varredura de pianos, guitarra e cordas. Em outras palavras, “Tell Me It’s Over” parecia um passo na direção certa, depois que o primeiro single iniciou a transição para um som mais adulto e contemporâneo. Frequentemente, “Head Above Water” é atormentado por letras simplórias demais.
Somos agraciados com a fraca poesia de “Birdie” (“Como um pássaro trancado numa gaiola, e como posso escapar deste lugar e subir?”), bem como os clichês exagerados de “Love Me Insane” (“Você pega todas as peças e as coloca de volta, você costura meu coração à mão”). Outras vezes, as letras simplesmente não fazem o menor sentido. Há o humor estranho no pós-refrão de “Goddess”, a esquisitice de “Bigger Wow” e a terrível exposição da barulhenta “Dumb Blonde”, com Nick Minaj. A última citada é um power pop que reflete sobre a ideia de que as pessoas pensam que ela não é tão inteligente baseado no seu jeito de ser. Quando Nicki Minaj aparece durante a ponte, ela reforça o empoderamento da Avril Lavigne e faz algumas referências ao “The Pinkprint” (2015). Embora seja conhecida por baladas poderosas, Lavigne perdeu a mão nesse single. Uma música aparentemente inspirada pela Gwen Stefani em meados de 2004 e 2005. A introdução formada por cânticos e a pancada de bateria imediatamente trazem à mente “Hollaback Girl”. O refrão, no entanto, é típico da canadense – uma produção mais eletrônica do que o pop rock do início de sua carreira.
As letras são extremamente previsíveis e acredito que qualquer um poderia ter adivinhado o tema antes mesmo de ouvir a música completa. Basicamente, Avril Lavigne fala sobre os estereótipos das mulheres loiras. “Eu não sou uma loira burra / Eu não sou uma Barbie estúpida”, ela canta no refrão. A conexão entre Lavigne e Minaj poderia ser bastante improvável, mas isso não torna essa faixa atraente. Muito pelo contrário, “Dumb Blonde” é uma canção brega, azucrinante e completamente irritante. É a música pop no seu pior estado. Uma mistura agitada de punk, pop e hip hop que tenta encobrir o emponderamento e a autoestima, mas falha drasticamente. Há uma série de outros escritores creditados neste álbum, mas “I Fell in Love with the Devil” não possui ninguém por trás, além da própria Avril Lavigne. “Armas e rosas fazem uma poção mortal / Explosões de corações partidos em movimentos descuidados / Ursinhos de pelúcia e cartas de desculpas / Não parecem melhorar as coisas”, ela canta aqui. Por que espingardas e rosas fazem uma poção mortal, e o que ursos de pelúcia e cartas têm a ver com um banho de sangue? E o refrão é completamente previsível: “Eu me apaixonei pelo diabo / Estou sob o seu feitiço / Alguém me mande um anjo / Para me emprestar uma auréola”.
Novamente, é uma vergonha – porque as cordas que cobrem o pano de fundo adicionam uma atmosfera exuberante e a melodia vocal é linda. É difícil para qualquer compositor criativo não se ofender com a estupidez dessa música, um sentimento que pode ser estendido a praticamente todo o álbum. As letras importam, mesmo na música pop, embora às vezes fingimos que não. Felizmente, a tracklist possui algumas joias escondidas no seu interior. Em outros lugares, como na balada de piano “It Was in Me” e na belíssima “Crush” – uma ode para os melhores momentos do amor precoce -, ela consegue encantar de verdade. Dito isto, a coisa mais difícil de engolir no “Head Above Water” é que, na maior parte do tempo, não há nada errado com as músicas em si. É um pop previsível e agradável com mais do que sua parcela de refrões cativantes. É definitivamente mais empolgante do que seu último álbum, e deveria pelo menos ser criticamente recebido como um registro mediano. No entanto, toda a maturidade parece desonesta a partir do momento que ela não consegue reunir algo melhor do que as letras apresentadas. Ademais, ela continua recaindo quando canta músicas tão superficialmente juvenis como “Dumb Blonde”. Os fãs do “Let Go” (2002) e “Uner My Skin” (2004) merecem coisa melhor.