Infelizmente, “Music to Be Murdered By” não é um bom álbum – na verdade, faz tempo que o Eminem não faz jus ao seu legado.
De vez em quando, Eminem ainda faz músicas boas, mesmo que os haters não admitem ou acreditem. Então, para cada “Relapse” (2009) ou “Revival” (2017), há um “The Marshall Mathers LP2” (2013) onde o MC talentoso consegue reagir e mostrar porquê foi tão famoso no passado. Com o “Music to Be Murdered By”, está começando a parecer que ele lança álbuns de surpresa porque é mais fácil do que conseguir um single de sucesso. No entanto, ele mais se assemelha ao “Recovery” (2010), uma vez que ambos são relativamente básicos. Mais uma vez, Eminem mostra seu domínio da língua inglesa enquanto produz rimas e alusões, independentemente do assunto de sua música. Aqui, como o próprio reconheceu tardiamente, as únicas coisas que ele assassinou foram as batidas. O suspense assume o controle quando ele leva seu tempo para entrar na primeira música do álbum – mas quando o faz, começa de forma surpreendentemente irritada. Sua atitude defensiva continua por todo o resto do álbum – ele conta com a ajuda de rappers em ascensão e outro pré-estabelecidos. Seu talento impiedoso ilustra as inúmeras maneiras diferentes pelas quais ele pode insultar seus inimigos enquanto se eleva. Em termos líricos, ele combinou as brincadeiras confusas do “Kamikaze” (2018) com a falsa grandeza do “Revival” (2017).
Mas os melhores momentos aparecem quando ele apenas associa palavras, em vez de tentar dar algum significado para elas através do seu ego inflado. Há um fluxo e uma velocidade matadora em faixas como “Godzilla” e “Little Engine” – embora nenhuma chegue aos pés de “Rap God”. Mas os convidados não ficam para trás, então, pela primeira vez, Eminem parece competir com seus colegas. Anderson .Paak se destaca em “Lock It Up” enquanto Young M.A fica responsável pelo incrível gancho de “Unaccommodating” Frases como “eu vendo cerca de 4 milhões quando lanço um álbum ruim”, continuam sendo hilárias e certamente sinceras. Entretanto, “No Regrets” não é a melhor maneira de intitular uma música para pedir desculpas pela sua última crise pública. Porém, eu tenho que agradecer ao recém-chegado Don Tolliver pelo refrão melódico – é uma visão introspectiva da história conturbada do Eminem e de suas observações depreciativas. Se está tentando descobrir como ser um artista interessante novamente, ele melhorou o calibre de suas batidas e está fazendo rap com a precisão maníaca de alguém que acabou de cheirar um punhado de cocaína. Abrindo com “Premonition – Intro”, ele fala sobre sua amargura em relação ao “Kamikaze” (2018), depois que não recebeu as críticas que esperava.
Também vemos Slim Shady olhando para trás ao citar o “Revival” (2017), desejando ser creditado por sua longevidade na indústria da música. Ele sente que sua consistência está sendo ofuscada por comentários negativos de que seu auge definitivamente passou. Isso é algo que ele, agora com quase 50 anos, teme? Em “Darkness”, ele pergunta: “Essa é a multidão toda? / Eu pensei que esse show tivesse esgotado”. No videoclipe, Marshall reencena o agressor do tiroteio em massa que aconteceu em Las Vegas. De fato, o vídeo ressurge uma tragédia e destaca o controle de armas através da menção de leis desequilibradas dos Estados Unidos. Como uma das músicas mais contundentes, “Darkness” exemplifica suas habilidades com palavras e múltiplos significados. Amostrando a famosa “The Sound of Silence”, de Simon & Garfunkel, ele usa especificamente a linha “hello darkness my old friend” como parte da batida para criar um ambiente sombrio e misterioso. A ambiguidade inicial de quem ele está descrevendo mistura a raiva do narrador com sua frustração geral sobre a prevalência de tiroteios em massa. As cenas de créditos no final do videoclipe apenas solidificam esse ultraje, com uma mensagem que diz: “Quando isso vai acabar? Quando um número suficiente de pessoas se importa”. Entretanto, essa mensagem sobre a gravidade da violência armada parece colidir com outras músicas do álbum.
Em particular, essa hipocrisia é evidente na facilidade com que Eminem se torna indelicado. Enquanto recrutou um conjunto bem-sucedido de rappers, incluindo Q-Tip e Juice WRLD (o rapper de Chicago que morreu em dezembro de 2019), ele continua fazendo referências a vários outros artistas, como Dr. Dre, Wu-Tang Clan e Ice Cube. Dito isto, foi a palavra falada de Alfred Hitchcock, em 1958, que inspirou o título do álbum. Numerosas citações arrepiantes de Hitchcock sobre assassinatos foram colocadas no repertório. Juntamente com críticas negativas, Eminem tem lutado com as redes sociais. Depois que “Unaccommodating” foi lançada, uma tempestade de comentários negativos eclodiu na web por causa das letras. “Mas estou contemplando, gritando ‘bombardeie’ no jogo / Como se estivesse esperando do lado de fora do show da Ariana Grande”, ele diz aqui. Isso levou a críticas severas dos pais daqueles que perderam seus filhos no atentado de Manchester, incluindo a mãe de Charlotte Hodgson, de 15 anos. Enquanto “Music to Be Murdered By” tem mais de vinte faixas, a maioria é instantaneamente esquecível e familiar – às vezes parece que foram recicladas de álbuns anteriores. Na maioria das vezes, “Music to Be Murdered By” cobre assuntos antigos com temas relacionados a “putas”, rappers, álcool, Detroit e pseudônimos.
No entanto, existem algumas faixas que quebram o molde e a mesmice. Mesmo que menos deprimentes tematicamente, elas destacam suas habilidades como um MC narrativo. Claro, já ouvimos ele falar sobre problemas familiares várias vezes antes, mas “Stepdad” ainda consegue ser uma entrada impactante e agradavelmente melódica. Uma esmeralda do álbum, onde Eminem está fechando completamente o armário do seu pai, é “Leaving Heaven”, com participação de Skylar Gray. Mathers só fica mais versátil e irritado se você continuar o cutucando. Não estou chocado com sua malícia absoluta em relação ao pai, mesmo depois de sua morte em junho de 2019. “Those Kinda Nights”, que o vê se reunindo novamente com Ed Sheeran, é provavelmente sua música mais alegre e animada dos últimos anos. Ela serve como um alívio cômico, pois Eminem reflete sobre as noites despreocupadas que surgiram no início de sua carreira, quando ele e sua equipe tinham toda a liberdade do mundo. Neste ponto, “Those Kinda Nights” é o mais próximo que provavelmente ouviremos do garoto loiro que fez hits alegres como “Purple Pills” e “My Band” há muitos anos. Embora inofensiva, “Never Love Again” é bastante cativante, enquanto “Yah Yah” é a peça mais poderosa da tracklist – destaque para o som old-school.
É a única música que chega perto de recriar a adrenalina tenaz dos seus primeiros discos. Mas ele sozinho não pode receber todo o crédito; o potencial de “Yah Yah” deve ser compartilhado igualmente com Royce Da 5’9″, Black Thought, Q-Tip e Denaun. Com o citado Royce Da 5’9″, Eminem também aproveita sua química pré-estabelecida em outras duas faixas, “You Gon’ Learn” e “I Will”. Inovação e experimentação são duas coisas que deveriam ser necessárias no “Music to Be Murdered By”. Mas sua tentativa fracassada de ser assustador, não deixa faixas como “Little Engine” serem levadas a sério. “Ainda sou aquele que seus pais odeiam”, ele diz. Apesar da participação de um exército diversificado de colaboradores, a maior parte do álbum é ruim. Não há dúvida de que Eminem é um dos rappers mais talentosos, mas além de suas palavras e fluxo, não há nada substancialmente novo aqui. As batidas influenciadas pelos anos 90 são proeminentes e o conteúdo é familiar. O hip hop, no entanto, mudou, e sua recusa em aceitar as mudanças, indica que ele precisa ir além de seu conforto, antes que seja deixado para trás para sempre. “Music to Be Murdered By” caiu como uma surpresa nessa sexta-feira, e o que se seguiu foi apenas uma versão mais abafada de suas indignações. As pessoas costumavam ficar empolgadas em ficar chateadas com seus álbuns.
Agora, ele se compara ao atirador de Las Vegas e ao bombardeiro de Manchester, e, consequentemente, há pessoas chateadas com sua falta de sensibilidade. Mas além disso, outra pessoa que parece realmente estar chateada com o Eminem é o próprio Eminem. Ele não tem filtro quando fala e está disposto a ser trágico, assustadoramente doloroso e honesto sobre o que está acontecendo dentro de sua cabeça. O problema, é claro, é que isso não se traduz necessariamente em músicas boas. Ele co-produziu quase todas as faixas, às vezes com velhos amigos como Dr. Dre e The Alchemist. Ele também trouxe figuras mais jovens do rap que atendem à sua própria definição sobre o que o rap deveria ser – Young M.A e Anderson .Paak, por exemplo. Mesmo com a produção questionável e as letras ultrapassadas, Eminem ainda faz rap com paixão e autoridade. Ele é decidido e obstinado – em termos de técnica, continua imparável. Às vezes, parece que ele está contente em ser o Eminem, o que quer que isso signifique em 2020. Eu, particularmente, não me vejo ouvindo esse álbum muitas vezes. Ainda assim, o Eminem deste álbum parece mais presente e focado do que àquele dos dois LPs anteriores. Ele parece estar amando o rap novamente. Talvez se ele continuar nessa direção, finalmente voltará a fazer música boa de verdade. Seria chocante, porque ninguém está esperando por isso.