“High Road” parece disperso e carregado de tensão, como alguém tentando buscar algum tipo de equilíbrio.
É seguro supor que todos conhecemos a Kesha, mas depois de ouvir o seu quarto álbum de estúdio, “High Road”, devo admitir que não fiquei impressionado. Há uma década, quando tinha 22 anos de idade, ela surgiu em meio aos holofotes de “Tik Tok” – seu maior hit até hoje. Naquela época, o EDM estava explodindo dentro do mainstream. Sua música era bastante imprudente, além de utilizar exageradamente sintetizadores desprezíveis e fortes batidas eletrônicas. Às vezes, ela nem se preocupava em cantar, visto que a maioria de suas músicas eram impulsionadas por um falso rap e palavras auto-sintonizadas. Sua presença nas paradas musicais deu uma freada quando ela passou por uma batalha legal com o Dr. Luke – acusado por agressão sexual e assédio. Seus dias mais sombrios resultaram nas composições do “Rainbow” (2017), seu melhor álbum até então. Kesha tirou o cifrão do seu nome, mudou de estilo e passou a cantar músicas mais vulneráveis. Posteriormente, ela resolveu gravar o “High Road”, descrito como um “retorno às suas raízes pop”. Aqui, Kesha parece bem mais despreocupada e otimista, mas muitas vezes se perde em sua própria festa. Apesar de tentar voltar às suas raízes, ela não consegue se comprometer totalmente com a magia de músicas como “Tik Tok” e “We R Who We R”.
Ademais, também não consegue permanecer na mesma positividade do “Rainbow” (2017). Consequentemente, acaba fornecendo letras muito escandalosas para tocar nas rádios. “Rainbow” era característico e singular, e tentar fazer as pazes com seu passado se tornou uma tarefa muito difícil. Kesha está em transição, tentando buscar equilíbrio com o passado e o futuro para, assim, dar à sua música uma identidade. Os poucos bons momentos do registro são recheados pela vulnerabilidade de suas baladas. O “High Road” é ironicamente o maior ponto baixo de sua carreira. Pareceu tão estranho ela sair de um “Rainbow” (2017), um álbum sério dedicado a expor sua longa batalha legal com o Dr. Luke, para um projeto tão confuso e contraditório. Tentando se promover com atual onda do mainstream, “Raising Hell” é sua busca por um hit. Porém, definitivamente não vale a pena. Nem mesmo a participação do animado Big Feedia foi capaz de mudar o rumo das coisas; ele é completamente negligenciado, mesmo injetando elementos de bounce. A estética sonora de “Raising Hell” surge frequentemente no “High Road”, muitas vezes de forma inesperada e desnecessária. Inicialmente, o álbum até cumpre sua promessa de retornar às raízes pop da Kesha.
“Tonight”, por exemplo, começa com vocais crescentes antes de mergulhar em um electropop com influências de hip hop. Sobre a mesma energia juvenil, “My Own Dance” fala sobre ficar chapada e apenas ser ela mesma. “Acordei esta manhã, me sentindo eu mesma / Ressaca como o inferno de 2012, foda-se”, ela diz nas primeiras linhas. Enormes harmonias e declarações de independência aparecem por toda parte. No entanto, os vocais desgastados e as letras desconexas atormentam a produção de uma das músicas mais animadas. Uma das poucas canções que me agradaram de primeira foi a faixa-título; sua energia familiar, melodia abrasadora e refrão borbulhante são muito cativantes. Outra canção agradável é “Honey”, um número discreto tingido de R&B sobre uma ex-amiga. Ela possui riffs mais simples e é uma reminiscência de alguns de seus melhores trabalhos. O refrão melódico e os versos falados incorporam uma raiva subjacente com a qual ela claramente fez as pazes. Dito isto, “Honey” é uma das poucas boas surpresas do álbum. À medida que o LP se aprofunda, parte da vulnerabilidade que se destacou no “Rainbow” (2017) se infiltra, particularmente na comovente “Father Daughter Dance”.
Kesha, criada por uma mãe solteira, canta: “Em todos os meus dias, do meu berço ao meu túmulo / Eu nunca terei uma dança de pai e filha”. Juntamente com “Praying”, “Father Daughter Dance” prova que ela pode ser profundamente pessoal quando quer. É uma âncora bem-vinda ao escapismo e ao espírito festivo do repertório. “Shadow” revela uma pitada de sotaque, mas Kesha não sacrifica suas letras descaradas; ela ainda está “tropeçando no deserto com suas melhores amigas” na primeira balada do disco. Esse espírito também é o guia da irrevogavelmente divertida e acústica “Cowboy Blues”, que pondera as conexões perdidas através de perguntas: “Você já deitou na cama com seus três gatos / E ficou obcecada com um garoto que você conheceu / Uma vez três anos atrás em Nashville / E você não consegue lembrar o sobrenome dele?”. Infelizmente, esses momentos fugazes não são indicativos do que realmente se trata o “High Road”. Desta vez, Kesha não conseguiu atingir um forte senso de identidade. Sua mania de ser bagunçada quando produz os arranjos vocais faz com que algumas músicas sejam inevitavelmente esquecíveis – especialmente “Birthday Suit” e “BFF”.
Os teclados tentam injetar algum carisma, mas Wrabel – que está surpreendentemente parecido com o Adam Levine – se perde pelo caminho. Entre a variedade de “Kinky” (uma colaboração com seu antigo apelido) e a inocência da cintilante “BFF”, temos a oferta mais bizarra da Kesha: “Potato Song (Cuz I Want To)” – o título já é suficiente para afastar qualquer ouvinte. Os metais podem até ser atrevidos e ambiciosos, mas é impossível levar essa música a sério. “Vou plantar batatas e flores / Então eu vou fazer castelos de areia, então eu vou comer um pouco de bolo”, ela canta no refrão. A desconexão sônica prova que ela está lutando para encontrar alguma coisa que se torne memorável. “Little Bit of Love” explora um território lírico mais aceitável, mas se atola nas referências óbvias e nas influências de disco – sem mencionar os versos irritantes. “High Road” é praticamente um teste de resistência para o ouvinte; os piores momentos líricos são motivados por uma ideia paranoica e desordenada. Kesha se contradiz a cada momento e testa nossa paciência durante o processo. A produção está à altura da música pop de 2020: eficaz e apropriadamente barulhenta.