Adriana Calcanhotto acaba de lançar um novo álbum, intitulado “SÓ” – um trabalho concebido e finalizado em quarenta dias em plena quarentena. O LP carrega uma história inusitada dentro da carreira da artista gaúcha. Diante da pandemia que está assombrando o país e o mundo, ela foi impedida de voltar para Coimbra, em Portugal, onde leciona e é embaixadora de universidade. De fato, o Brasil parou quando foi decretado o estado de calamidade pública. E o tempo ganhou um novo sentido. A partir daí, Adriana propôs a si mesma o desafio de compor uma música diariamente até a hora do almoço. Esse trabalho árduo resultou em seu décimo segundo álbum de estúdio. Dito isto, o repertório abre com “Ninguém na Rua”, uma canção de MPB com versos como: “Céu preto inteiro antes da uma / Ninguém na rua, nem mesmo a luz da lua”.
Se para algumas pessoas a quarentena tem se tornado um momento de desânimo, para outras tem sido uma oportunidade de se dedicar ao trabalho, como é o caso de Adriana Calcanhotto. Além de trazer uma batida inusitada, as letras falam do isolamento de forma intrinsecamente otimista. Com a fusão orgânica de funk e MPB, “Ninguém na Rua” contrapõe o olhar crítico do momento que passamos. É uma canção tão melancólica quanto radiante – os acordes prepotentes da guitarra ancoram os vocais enquanto os tambores injetam uma força extra. Felizmente, a arte de Calcanhotto subverteu o tempo e espaço. Sua experiência pandêmica brotou nessa canção de forma inesperada. Ela é uma das artistas brasileiras que mais deu forma às angústias e aos medos que surgiram nesse momento de incertezas. “Eu era levada pelo impulso das notícias, das emoções provocadas através das telas”, ela conta. E a disciplina foi a companheira do seu processo criativo. “Acordava, fazia café, vinha para o estúdio aqui de casa e escrevia, era quase um surto”.