Embora “Californian Soil” nem sempre cumpra sua ambição, ele ainda mostra que vale a pena ouvir esse grupo.
Ousado e corajoso em essência, London Grammar acabou de lançar o seu terceiro álbum de estúdio, “Californian Soil”, quatro anos depois do seu último registro, “Truth is a Beautiful Thing” (2017). A maturidade e a abordagem magistral da banda se tornam ainda mais aparentes em suas letras. De fato, London Grammar está em uma jornada mais emotiva e purificadora, tanto no som quanto nas letras. Hannah Reid sempre teve um talento especial para criar melodias isoladas com o objetivo de ser extremamente emotiva em suas mensagens. Mas, desta vez, ela e seus outros companheiros de banda, Dot Major e Dan Rothman, resolveram apresentar um som que reflete em sua autoconfiança. As lindas peças orquestrais, misturadas com construções eletrônicas, proporcionam uma experiência auditiva emocionante. A composição é igualmente impressionante e se adapta ao novo ambiente com um toque sombrio, visto que “Californian Soil” é sobre a experiência de Reid como mulher. É sobre ela ganhando posse de sua vida, em parte depois que quase deixou a indústria musical “sexista e exploradora” em 2019.
No entanto, às vezes, o novo som pop não suaviza as peculiaridades do London Grammar, mas o coloca em um contexto totalmente diferente. Sua força é perdida na produção conforme a banda volta ao que fazia anteriormente, mas ainda empregando um pouco do estilo de produção atual – isso resulta em um tom confuso. Muitas vezes, a entrega vocal supera o tema da música, o que significa que o conteúdo lírico fica borrado e ignorado. Apesar desses erros, o grupo lançou seu projeto mais versátil e expansivo até então. Embora parte da intimidade das canções possa ser perdida, London Grammar ganhou aquela maior variedade que evita a monotonia dos álbuns anteriores. Dito isto, quando a banda chegou pela primeira vez a uma cena musical fortemente saturada quase uma década atrás, sua marca emotiva atraiu comparações com The xx e Florence and the Machine, tanto quanto chamou a atenção do público mainstream. Marcado pelo alcance vocal dinâmico da Hannah Reid, o trio britânico se destacou de seus contemporâneos – e eventualmente de seus imitadores – porque sua música exibia uma seriedade e contenção distintas.
Com seu segundo álbum, “Truth Is a Beautiful Thing” (2017), eles continuaram fazendo uma música pop elegante e de bom gosto, embora desta vez a maior grandiosidade da produção tenha deixado a sensação ocasionalmente vazia e sem vida. Em “Californian Soil”, eles ajustam levemente seu som para sugerir o escopo de suas ambições musicais, mas os resultados são mistos. London Grammar revela sua vontade de explorar novos territórios na faixa-título; há um peso instrumental que grande parte do álbum carece, mesmo que o aceno óbvio para “Teardrop” do Massive Attack não seja apoiado pela quantidade certa de tensão. A faixa-título começa com uma linha de guitarra que aumenta gradualmente e possui um refrão incomum. Significativas em sua entrega, as letras avançam com convicção enquanto o som toma uma direção folk. Além disso, ouvimos Hannah mergulhar em uma miríade de temas. Além disso, notas mais rígidas entram na mistura. Musicalmente é emocionante – como você esperaria do London Grammar -, embora a atmosfera permanece relativamente condensada. No entanto, a energia ainda flui e é difícil culpar sua abordagem.
Mas, como um todo, “Californian Soil” sofre do problema oposto: está claro que a voz poderosa da Hannah Reid não perdeu sua ressonância, mas nem sempre pode compensar as lacunas deixadas por composições fracas e produções brandas. “Missing” apresenta uma de suas performances mais detalhadas, embora o que exatamente ela está cantando permaneça ambíguo. Essa imprecisão emocional define boa parte do repertório: Reid abre “How Does It Feel” com a seguinte linha: “Pura emoção, deixe queimar”, mas conforme a canção se desenvolve em uma tentativa insípida de revivalismo disco, você fica se perguntando como ela realmente se sente. Com um título que remonta à colaboração inovadora do grupo com o Disclosure (“Help Me Lose My Mind”), “Lose Your Head” tem um refrão similarmente cativante, mas não consegue fazer sua fórmula morna parecer refrescante. Ela aborda relacionamentos emocionalmente manipuladores e uma toxicidade onde poder e controle parecem ser o tema central. Mas mesmo com uma mensagem sombria, a produção de “Lose Your Head” é otimista e flutuante. Há casos em que a capacidade da Hannah Reid de entrar em um estado emocional específico eleva a natureza geralmente indefinida das letras.
“Lord It’s a Feeling” se destaca como uma balada evocativa que lida com a infidelidade, exibindo uma rara ousadia vinda de um grupo distintamente de classe média como London Grammar. “Eu vi o jeito que você riu pelas costas dela / Quando você fodeu outra pessoa”, Reid canta no final do primeiro verso, acendendo um fósforo antes de entregar um refrão escaldante. Embora a escrita se beneficie de um pouco mais de profundidade, a música visa despertar um senso de empatia enraizado ao invés de pintar um quadro detalhado – a percussão vigorosa ajuda a construir a atmosfera ao seu redor. Apesar da Hannah Reid ter expressado incertezas sobre “Call Your Friends”, sua vulnerabilidade estimulante e a memorável melodia a torna um claro destaque na tracklist. A atmosférica “Baby It’s You”, por sua vez, mostra que a banda é mais do que capaz de integrar um som otimista em seu estilo usual, trocando a melancolia por uma exuberância que parece totalmente genuína em meio a uma enxurrada de sintetizadores cintilantes. A uniformidade sonora do álbum pode ter o efeito de conter algumas de suas explorações mais interessantes da feminilidade e da indústria musical em geral.
Mas os esforços do grupo para apresentar uma linha temática mais forte não foram totalmente perdidos. A última faixa, “America”, vai para um lugar que sua música dificilmente esteve antes, amarrando sua própria jornada musical aos falsos ideais de uma nação da qual eles nem mesmo fazem parte: “Todo o nosso tempo perseguindo um sonho / Um sonho que não significou nada para mim”, Reid canta. Há uma honestidade aí que contradiz qualquer suspeita de que o London Grammar está apenas interessado em jogar pelo lado seguro neste momento de sua carreira. Liricamente, esse álbum parece catártico: a maior parte do conteúdo gira em torno do feminismo e responde à misoginia que Reid enfrentou na indústria. Ao encará-los como a vocalista da banda, há mais vulnerabilidade – mas também mais energia – em sua exibição. “Californian Soil” não é o álbum pop ensolarado que o título sugere; é um projeto sólido com luz e sombra se misturando gradualmente. Não é perfeito, muito menos uma reinvenção. Entretanto, provoca uma escuta digna de repetição de um grupo cheio de confiança e convicção.