Os refrões de Alicia Bognanno são mitigados pela produção do seu quarto álbum de estúdio.
Bully é o projeto solo da cantora, compositora e guitarrista americana Alicia Bognanno. O projeto começou originalmente como uma banda de rock, formada em 2013 em Nashville, Tennessee. Bognanno já mostrou uma habilidade inata de canalizar suas emoções em canções de rock extáticas influenciadas pelos anos 90. Bully tem o tipo de discografia que parece totalmente formada, com todas as complexidades que se esperaria de qualquer uma das bandas que ela se inspira. Mas mesmo antes de reinventar a banda como um projeto solo em 2020, Bognanno escreveu, compôs, produziu e mixou todos os discos do Bully. No controle por trás do microfone e das produções, ela cultivou um rock alternativo completamente cru. Seu álbum de estreia, “Feels Like” (2015), era animado e poderoso; o segundo álbum, “Losing” (2017), também era cativante, embora menos promissor; e por último “SUGAREGG” (2020), seu trabalho mais lúcido e revigorante até hoje. Seu quarto álbum, “Lucky for You”, por sua vez, é recheado de nostálgicas e urgentes canções de rock alternativo. Embora imediato e inegável, é talvez o seu álbum menos inspirador.
Bully soa como uma banda, mas sempre foi Alicia Bognanno nas rédeas. Ela canalizou isso de maneira mais formal com “SUGAREGG” (2020), quando se tornou oficialmente seu projeto solo. Cada som que enfeita “Lucky for You” é afinado com precisão. É uma experiência auditiva de alta definição, comprimido e brilhantemente polido. No decorrer de dez faixas, Bognanno flutua acima da mixagem ou desce oportunamente sob um emaranhado de guitarras. É denso e cheio de ideias – veja “Hard to Love”, que oscila entre padrões de bateria, uma ponte arrancada de alguma música pop dos anos 2000 e um refrão rosnante. Bognanno disse que foi o álbum que ela mais demorou para concluir. E, de certa forma, “Lucky for You” é sobre o tempo. Ela não fez isso totalmente sozinha, no entanto. Embora Bognanno tenha gravado algumas guitarras e se envolvido em sua produção e mixagem, JT Daly é creditado como o único produtor. Ele foi indicado ao Grammy por engenharia, mas não se sai muito bem aqui; nenhum dos instrumentais está à altura de “Feels Like” (2015) ou “SUGAREGG” (2020).
A mixagem enlameada não afunda totalmente suas composições – “Days Move Slow” está entre as melhores canções de rock do ano -, mas várias faixas ficam aquém do esperado. “Lucky for You” muda o som do Bully para um pop rock radio-friendly, recentemente tornado popular por artistas como Olivia Rodrigo. Não é o ambiente tradicional de Alicia Bognanno – o que poderia explicar sua escolha de passar as rédeas para outro produtor. Entretanto, suas performances vocais surpreendem mesmo assim. O rosnado em “Hard to Love” é um destaque a parte; “How Will I Know” é uma reviravolta grunge que foca, em vez da paixão, na proximidade da morte. “Se fores antes de mim, manda-me um sinal”, ela canta, antes de se perguntar se isso será realmente possível: “Como vou saber?”. Bognanno escreveu a melhor faixa do álbum, “Days Move Slow”, enquanto lamentava a morte do seu amado cachorro, Mezzi. Do luto, ela extrai algo cinético e insistente. Ela desenha cada palavra do título como se estivesse puxando um elástico. Sua percepção é totalmente sobre mortalidade, com referências diretas à vida após a morte, à crença em Deus, a buquês em sepulturas, etc.
“Estou vivendo no mesmo buraco negro”, ela canta no refrão. “Mas há flores em seu túmulo que crescem / Algo tem que mudar, eu sei”. Mais tarde, Bognanno canta na melosa “Lose You”: “O tempo é apenas uma medida inútil da dor / Você pode levar todo o tempo do mundo, as coisas nunca mais serão as mesmas”. É um dueto com outra artista talentosa, Soccer Mommy. Embora “Lose You” seja principalmente sobre a estase inevitável da morte, elas são dinâmicas o suficiente para iluminar os momentos mais sombrios. Bully batalha contra a perda e luta contra o quão impossível é consertar as coisas que já aconteceram. “De qualquer forma, vou perder você”, ela canta no refrão oscilante. Bognanno transforma seu desespero em refrões afiados, uma dor que às vezes parece tão boa. Mas, como mencionado anteriormente, nem tudo aqui é bem-sucedido. “Change Your Mind” vive enterrada em clichês: “Tudo o que eu queria era me sentir querida”. Em outras faixas, como na ousada “A Love Profound”, Bully experimenta novos estilos vocais, mas é prejudicada por uma mixagem pantanosa.
Aqui, ela desliza entre conversas sussurradas sobre o mal-estar que vem com o fim dos dias (“E o que mais me incomoda é testemunhar sua falta de interesse pelas coisas que você amou”). As duas últimas faixas, “Ms. America” e “All This Noise”, são mais politizadas, aquelas que expressam exaustão e frustração por não ter espaço para lamentar por causa de tudo de terrível que está acontecendo no mundo. Ambas meditam sobre o estado da união e cada uma se fecha com um único registro emocional: “Ms. America” é uma espiral pessimista de luto, onde ela se afunda em um desânimo, embora soe quase edificante devido às linhas de guitarra sinuosas e melodias cristalinas: “É difícil quando a tragédia cai e o mundo continua seguindo em frente”, ela canta; “All This Noise” é um punk furioso onde ela nomeia ursos polares antes de berrar: “Meu corpo não é sua escolha”. Ela imediatamente se lança na fúria de “All This Noise”, onde também sopra com uma ansiedade familiar: “Estou cansada de esperar por mudanças e debater”, ela rosna. “O que mais há para fazer quando você não pode escapar das notícias”.
No final das contas, porém, “Ms. America” é mais convincente e comovente. Bognanno considera se deve ou não ter filhos e silenciosamente decide: “Não quero ensinar uma criança a lutar”. Parece realmente honesto; é esse tipo de introspecção lírica e complexidade emocional que atraiu os ouvintes para o seu álbum de estreia. Bognanno preserva pontos importantes dos discos anteriores, mas “Lucky for You” se esforça dentro de novas experimentações. De fato, ninguém pode produzi-la melhor do que ela mesma. O álbum é focado principalmente em uma coisa: o quão difícil pode ser superar a perda. Bully retorna aos mesmos sentimentos, não de forma repetitiva, mas de maneira que enfatiza a ferida. “Lucky for You” permite que ela processe seu desespero, criando uma carta de amor para o tão esperado fim do processo de luto. Como a própria dor, a narrativa evita um caminho linear para a resolução, mas o faz sem parecer sinuosa. Pelo contrário, em sua essência, o álbum é uma prova da capacidade de Alicia Bognanno navegar e encontrar significado até mesmo nos momentos mais desafiadores. É um registro confiante que revela a suavidade por trás do feedback e do fuzz que continuam fazendo parte do seu repertório.