A artista peruana Daniela Lalita, cuja prática abrange música, figurino, cinema e artes plásticas, acabou de lançar o seu EP de estreia, “Trececerotres”. O título é uma referência direta ao apartamento, 1303, no Peru, onde a artista cresceu com a mãe e avó. “Trececerotres” está enraizado na magia, cura e na relação matrilinear. Cada música aqui parece um modo diferente de canalização ancestral. A peruana estende sua voz a profundidades cruas e guturais, atingindo alturas brutalmente emocionais ao longo do repertório. As distorções vocais de Lalita se misturam com bateria e sintetizadores para criar um som moderno e místico. Na quinta faixa, “Pisoteo”, ela lamenta a maneira como a morte nos rouba o tempo com nossos entes queridos. Sua performance a faz soar como se estivesse convocando seus ancestrais através de um hino fúnebre. Lalita estica os limites de sua voz, ofegando sobre o pulso da música, conforme suas palavras tremem no espaço. O videoclipe abre com uma narração de sua avó, que Lalita gravou em sua cama às 3 da manhã.
Em uma sequência coreografada por Lourdes Leon, Lalita então se contorce sob uma sala vazia. Ela se debate contra as paredes de tijolos, ao mesmo tempo primitiva e controlada, como se tivesse absorvido a sabedoria de sua avó. Desta forma, “Pisoteo” torna-se uma magistral contemplação artística, transformando a turbulência psicológica da morte em um potente exercício criativo. Trabalhando principalmente com o sintetizador, Lalita encontrou um mundo sem limitações de escalas tradicionais, com o instrumento proporcionando uma experimentação sem limites para uma artista cuja prática de gravação e sobreposição de vocais foi implementada na produção para criar uma multiplicidade de mundos sonoros. Aqui, sua cultura é explorada e os humores variam de sombrios e intensos a sinceros e seguros. De fato, “Pisoteo” é uma forte homenagem à sua avó que sobreviveu ao câncer, inspirando-se no modelo “Vespertine” (2001) de Björk, se desfocando em padrões fractais confusos. Daniela Lalita é uma força criativa absoluta: seu alcance alcança tudo o que ela deseja. Ela nos permite pensar que há muitas coisas para fazer, novos caminhos a explorar e não só na música, mas em tudo o que é criativo, por isso temos arte, para perceber que não há limites.