“TO LOVE IS TO LIVE” pode parecer um álbum imperfeito e impreciso – mas é aí que justamente mora a sua beleza.
Jehnny Beth, nascida como Camille Berthomier, é um cantora, compositora, produtora e atriz francesa, mais conhecida como metade da dupla eletrônica John & Jehn e frontman da banda de rock Savages. Ademais, ela já colaborou com outros artistas famosos, como Julian Casablancas, Gorillaz e Noel Gallagher. Além de ter uma carreira musical, Beth também já atuou em vários filmes, incluindo “Um Amor Impossível” (2018). Se afastando temporariamente de seu papel como vocalista do Savages, Beth descobriu que gravar um álbum solo era uma necessidade – ela não podia escapar do sentimento de criar algo que duraria além de seu tempo como músico e até como ser humano. Influenciada a gravar “TO LOVE IS TO LIVE” quando descobriu a morte de David Bowie, um incidente que abalou sua compreensão da arte, Beth subitamente percebeu que a música sempre sobreviveria ao seu criador e achou que era o maior motivador para escrever algumas das músicas mais pessoais e introspectivas de sua carreira. Ela não estava mais adiando suas intenções de fazer um disco solo, e decidiu que isso seria um testemunho de sua visão do mundo. No provocador “TO LOVE IS TO LIVE”, ela mistura elementos refinados com um som eletrônico rígido.
Beth também é muito articulada e evocativa em suas letras, e cobre uma paleta gigante de pensamentos e conceitos – da profunda ideia do que é ser humano a suas próprias emoções e experiências. A faixa de abertura, “I Am”, a encontra aparentemente imitando o personagem que ela encarna na capa do álbum. “Estou nua o tempo todo”, ela canta, “Estou queimando por dentro”. Essa música serve como uma adequada introdução ao álbum, especialmente porque injeta intensidade e foco. Sem maiores problemas, Beth então se muda para “Innocence”. Essa canção o estrangula desde o primeiro segundo, inundando você com uma onda sonora e vocais extremamente agressivos, embora controlados. Sua intensidade poderia espelhar a emoção sentida pela criatura que ela encarna, repentinamente experimentando o tumulto da experiência humana. Especificamente, “Innocence” aumenta as expectativas do título, contendo letras bastante cínicas sobre a humanidade. “É morar na cidade que tornou meu coração tão pequeno”, ela canta aqui. Qualquer pessoa que tenha sobrevivido à rotina da vida na cidade pode entender essa noção. De fato, “Innocence” é verdadeiramente eclética, equipada com letras poderosas sobre sentir-se desconectada e perdida em uma cidade grande.
Em outras partes do álbum, Beth explora a sexualidade humana e a intimidade através de uma perspectiva alienígena. “Flower” a faz lamentar da seguinte forma: “Não tenho certeza de como agradá-lo, não tenho certeza de como alcançá-lo, como tocá-lo”, durante uma batida suave de trip-hop. Essa criatura que ela encarna pode estar confusa sobre como professar seu amor, mas ela não percebe que todos os outros humanos têm o mesmo problema. A peça que acompanha essa música, “We Will Sin Together”, marca um dos poucos exemplos do álbum que mergulham excessivamente na “culpa católica faz a sexualidade parecer pecaminosa”. Pode ser apenas a minha opinião, mas adiciona um gosto amargo ao repertório. O meio do álbum dá uma guinada interessante com “A Place Above” – uma peça curta, mas intrigante, de palavras faladas, interpretada pela estrela de “Peaky Blinders” (2013), Cillian Murphy, que compartilha os pensamentos de Beth sobre “sua auto importância imaginada”. Talvez sua presença pareça retroativa ao show de Cillian Murphy, já que a música que a segue é “I’m the Man”, escrita para a série. Jehnny Beth fornece arrogância sobre uma cacofonia musical enquanto deixa um momento de vulnerabilidade silenciosa se aproximar do fim.
“I’m the Man” levanta sua voz para falar sobre a masculinidade tóxica de uma maneira quase penetrante: “Eu sou um homem, não há nenhuma vadia na cidade que não entenda o quão duro meu chute pode ser”. Durante todo o disco, Beth usa sua voz assim, com convicção e diferentes perspectivas, o que a torna interessante e surpreendente toda vez que uma nova música começa. A maneira intransigente de lidar com temas frequentemente delicados é algo que vale a pena admirar, especialmente quando ela admite que é igualmente culpada pelas coisas boas e ruins. Em “TO LOVE IS TO LIVE”, as músicas de rock são mais bem-sucedidas do que as faixas tranquilas, com a exceção tardia de “French Countryside” – um acompanhamento suave da explosiva “How Could You”. O álbum termina com “Human”, que repete as letras de “I Am” e adiciona novas que descrevem a deterioração física da cantora. No final, Jehnny Beth experimenta todo tipo de emoção, sejam boas ou ruins, e sofre pela devastação do tempo, como todo mundo. “TO LOVE IS TO LIVE” é breve, mas intenso – embora a narrativa às vezes sofra pelo foco sempre em mudança.