“Flower of Devotion” é um dos álbuns de rock mais animados e inspirados da memória recente.
Dehd, o trio de Chicago formado por Emily Kempf, Jason Balla e Eric McGrady, deu grandes passos em seu novo álbum, “Flower of Devotion”. É o primeiro disco depois do hype discreto de publicações e blogs independentes. Essa onda de atenção foi recebida após o lançamento do “Water” (2019), um álbum pós-punk minimalista, mas que não chegava ao ponto do tédio. Era diferente de muitos outros álbuns do gênero de bandas como Iceage, Savages e Preoccupations. Em “Water” (2019), Dehd sentiu que estava fazendo o máximo que podia com o que tinha. Aqui, no entanto, o espaço em que estão trabalhando parece se expandir. As guitarras, embora ainda pontudas e inspiradas no surf rock, reverberam de forma mais consistente. A bateria está um pouco mais pesada, e os vocais, especialmente os da baixista Emily Kempf, parecem mais pé no chão. Seu som usual ainda está em pleno vigor, mas ganhou mais profundidade e dimensão. Por meio de dois LPs e dois EPs, Dehd tem sido inflexível em sua abordagem. Eles optaram por manter sua música esparsa, íntima e crua, imitando a abordagem aperfeiçoada por The Velvet Underground e Patti Smith quase meio século atrás. O som do “Flower of Devotion” é realmente mais nítido, rico e ousado. A nostalgia, no entanto, permanece.
É uma proclamação estimulante de todas as coisas nostálgicas. É uma homenagem a música de eras passadas, relembrando momentos transformadores dos anos 70 e início dos anos 80. A nostalgia também se estende quando o trio muitas vezes olha no espelho retrovisor. As texturas arrebatadoras de “Desire” revelam imediatamente a natureza reflexiva da banda e como eles permanecem presos. “Amor eu te amo, estou sempre pensando em você”, Emily Kempf chora. Jason Balla, por sua vez, responde: “Ainda vou te ver com fogo nos olhos? Te vejo caminhando e sei que isso é um adeus”. As vibrações lúdicas de “Haha” tentam enfatizar a dor de um término, com Kempf racionalizando para si mesma: “Eu sei que te amava também, mas agora esse tempo realmente passou”. A arrogância americana de “Disappear” e o som de “Nobody” exploram ainda mais as consequências da recém-descoberta “independência”. O primeiro é tirado da perspectiva de Jason Balla, onde ele simplesmente quer evaporar no ar para que a dor vá embora. Emily Kempf, entretanto, anseia por ser vista novamente, mas percebe que deve primeiro se revelar. Em “Letter”, Dehd alcançou o ápice do tema central do álbum: desespero em meio a um coração partido.
A música treme com o brilho sombrio de Joy Division, ao passo que Kempf assume uma persona distante. Ela finalmente aceita o seu destino, fazendo uma última despedida ao seu parceiro. Enquanto muitos álbuns focam apenas no coração partido, Dehd leva a experiência mais longe ao abordar o isolamento que se segue. Com a voz de Jason Balla indo para lugares sublimes na inebriante “Month”, ele revela seu estado de espírito instável. “Vai e vem”, ele repete, como se simultaneamente revivesse memórias. A linda balada shoegaze “Flood”, mostra Kempf em desespero. Enquanto ela procura mudar tudo, entende que o passado não pode ser corrigido. Eventualmente, ela emerge debaixo d’água e encontra uma nova vida em “Loner”. Essa alegre canção é uma mistura de gêneros – um baixo parecido com Peter Hook, uma guitarra brilhante e sintetizadores que pulsam como uma versão lo-fi do New Order. Através do barulho nostálgico, Kempf lembra a si mesma que “estou bem, estou bem”. O verdadeiro despertar ocorre nas duas últimas canções, embora suas mensagens deem dicas do contrário. Com Eric McGrady assumindo os vocais principais, a banda retorna às suas raízes em “Apart”. Através de seu barítono profundo, McGrady afirma: “Eu me sinto desmoronando”. Envelhecer é a nova batalha, mas Dehd finalmente superou a angústia emocional que os dominou.
A arrebatadora “Flying” mostra a banda aceitando seu destino. Um trio que entende que eles ainda podem se amar, dar tudo um ao outro e ser amigos para o resto da vida. Eles podem ser uma família. E esse é um ideal que todos podemos nos esforçar para alcançar. “Flower of Devotion” é, nesse sentido, um álbum de crescimento; tanto o crescimento musical quanto o crescimento pessoal – além de algum sofrimento ou solidão que continua por toda parte. Embora a alta qualidade de produção possa nos pegar um pouco desprevenidos, tudo parece interessante e agradável. E, verdade seja dita, nunca abandona o compromisso do Dehd com a honestidade, enquanto Emily Kempf e Jason Balla enfrentam, pelo menos liricamente, sua verdadeira vulnerabilidade. Dito isto, “Flower of Devotion” impulsiona Dehd de um promissor arrivista a talentos comprovados. Eles encontraram seu som, descobriram as coisas que os tornam excepcionais e expandiram os aspectos de sua arte. Desde o início, “Flower of Devotion” provoca uma audição particularmente forte, apesar de sua textura às vezes pesada e sensibilidade taciturna. Contornando a periferia de sons como o shoegaze e o indie rock tradicional, o trio apresenta um registro surpreendentemente amplo e envolvente.