Pabllo Vittar transita por vários ritmos ao longo do álbum e mostra sua autenticidade sob influências brasileiras e internacionais.
Phabullo Rodrigues da Silva, mais conhecido como Pabllo Vittar, é uma cantora, compositora e drag queen maranhense. Ela ganhou notoriedade no final de 2015, devido ao videoclipe da música “Open Bar” – uma versão em português de “Lean On” do Major Lazer. Em 12 de janeiro, Pabllo lançou o seu primeiro álbum de estúdio, intitulado “Vai Passar Mal”. O álbum conta com 11 faixas e produção de Rodrigo Gorky, Mafalda, Weber e Diplo. Entre os escritores encontramos nomes como Stefanini, Yuri Drummond, Jefferson Silva e Pablo Bispo (que já trabalhou com Anitta e Ludmilla). Sonoramente, é um trabalho bem diversificado que faz mistura de pop, samba, tecnobrega, funk carioca, trap, hip hop, forró, arrocha, reggae, MPB e EDM – basicamente uma miscelânea de diversos ritmos brasileiros e internacionais. “Vai Passar Mal” é tecnicamente bem produzido com faixas curtas e letras focadas na vida, autoestima, superação, festas, paixões e romances. Para as fotos de divulgação do álbum, Pabllo Vittar aparece ao lado de vários manequins em uma fábrica. “A sessão foi pra mostrar que temos que brigar por nossa luz ao sol, temos que nos destacar de alguma maneira”, ela disse.
Natural de Santa Inês, interior do Maranhão, a artista de 22 anos é, sem dúvida, uma das maiores apostas do pop nacional para 2017. Vittar assumiu a homossexualidade aos 14 anos, e depois que se mudou para São Paulo começou a se montar como drag queen. Ele montou-se pela primeira vez aos 17 anos, e foi mãe que mais demonstrou apoio e o ajudou a enfrentar os desafios que a homofobia impõem. Para um país como o Brasil, que é muito intolerante e violento com travestis e transexuais, é admirável e gratificante ver Pabllo Vittar conseguindo tanto reconhecimento. Dito isto, ela está sendo um espelho para muitos jovens gays que tentam encontrar coragem para enfrentar o preconceito – sua arte, portanto, está servindo como um ato de resistência. “A gente tem que apoiar mesmo e levantar essa bandeira. Se hoje estou dando uma entrevista montada de drag, é porque muita gente morreu e sofreu preconceito para que eu ocupasse esse espaço”, ela disse em uma entrevista. “DJ toca o som, não quero saber mais de ninguém / DJ toca o som, tô ficando louca e cê também”, ela canta no agudo refrão de “Open Bar” – versão de “Lean On”, que foi muito tocada pelas boates do país antes do lançamento do álbum.
No entanto, diferente do seu primeiro EP, “Vai Passar Mal” traz apenas canções originais – não é um álbum inovador ou aventureiro, mas Pabllo Vittar fez um ótimo trabalho aqui. Depois do sucesso de “Open Bar” e da participação no programa “Amor & Sexo” da Rede Globo, ela precisou se desdobrar para conseguir dar conta de todos os compromissos profissionais. O primeiro single, “Nêga”, faz uma mistura de pop, funk, eletrônica e trap. É um pouco confusa, seja pela fusão inusitada de gêneros ou estrutura desorganizada. “Não vem com essa dizendo que não tem tempo pra mim”, ela canta inicialmente sob teclas de piano. Posteriormente, as batidas de funk carioca surgem e levam a música para uma queda sem graça. O vídeo foi filmado em uma mansão na cidade de Uberlândia, Minas Gerais, e apresenta um cenário fictício onde ela aparece deitada em uma cama rodeada de pessoas pelo chão. “K.O.”, por outro lado, é um forró eletrônico muito melhor e mais cativante. Uma música incrivelmente animada e dançante que celebra sua paixão por um determinado homem. Dessa vez, os vocais estão melhores colocados e a explosão tecnobrega é nada menos do que surpreendente. “Seu amor me pegou / Cê bateu tão forte com o teu amor / Nocauteou, me tonteou / Veio à tona, fui à lona, foi K.O.”, ela canta no infeccioso refrão.
“Irregular” é um synth-pop com sons mais leves, sintetizadores cintilantes e rápidas batidas de tambor – é outro acerto do álbum. Vittar canta de forma mais sensual e delicada, o tom da música parece mais confortável para ela – embora arrisque algumas notas altas próximo do final. Em “Corpo Sensual”, com Mateus Carrilho da Banda Uó, Vittar apresenta um arrocha delicioso com sintetizadores, buzinas, boa dose de bateria e pegajosos riffs de teclado. “Mandando ver, no vício da batida querendo se envolver / No estilo diferente, que prende e dá prazer / Eu sei que logo sente, te faço enlouquecer, faço ferver”, ela canta nas linhas mais atraentes. Não há dúvidas que o tecnobrega combina perfeitamente com o estilo vocal da Pabllo. “Todo Dia”, com seu amigo Rico Dalasam, é uma inesperada música de funk e trap que mostra sua atitude e autoconfiança. Dalasam, rapper negro e gay, escreveu a faixa e fornece sua voz áspera em algumas linhas. O refrão e batida de funk é o ponto chave da música, que faz uma pequena crítica social. “Eu não espero o carnaval chegar pra ser vadia, sou todo dia”, ela canta no refrão. Segundo Vittar, ser vadia é poder ser você mesma todos os dias, sem se preocupar com a opinião dos outros. O vídeo, com sua estética colorida e tropical, foi lançado a tempo para estourar no Carnaval.
“Tara”, por sua vez, passa meio despercebida no meio da tracklist – ela é apagada pela sequência de “K.O.” até “Corpo Sensual”. Embora tenha uma forte base de tambores, o tom da Pabllo está estranho e as letras não tem sentido algum; um amontoado de palavras soltas jogadas na mistura apenas para rimar. A colaboração com Diplo acontece em “Então Vai”, a sétima faixa do álbum. Diplo enviou uma versão para Pabllo Vittar, que escreveu as letras em português ao lado de Emily Drummond e Rodrigo Gorky. Liricamente, é uma canção sobre autoestima e perseverança – um tema presumivelmente recorrente no repertório. “Coração é cigano, sei também que é melhor pra mim / Foram tantos enganos, mas a vida tem que seguir / Então vai, então vai!”, ela canta no adorável refrão. É uma fatia eletrônica com elementos de reggae e pop latino surpreendentemente agradável – especialmente pela batida e diversidade dos instrumentos, que passa pelo sintetizador, guitarra, tambores e metais. “Ele é o Tal” possui a participação de Rodrigo Gorky e Laura Taylor do Bonde do Rolê, além da também drag queen Lia Clark. Uma música trap e eletrônica com fragmentos de funk e quebras no instrumental – ideal para as boates gay e pistas de dança.
A produção é meio ultrapassada e foca principalmente no instrumental rígido formado pelo baixo gaguejante, sintetizadores, metais flutuantes e batidas de bateria. O trap sintético de “Pode Apontar” infelizmente proporciona um final meio esquecível para o álbum; em determinado momento, os vocais distorcidos causam irritação. Em contrapartida, a balada de piano “Indestrutível”, apesar dos vocais excessivamente dramáticos e a interpretação exagerada, contém letras bem pessoais e autoconscientes. “Tudo vai ficar bem, e as minhas lágrimas vão secar / Tudo vai ficar bem, e essas feridas vão se curar”, Vittar canta sob singelas teclas de piano e cordas de violino ao fundo. “Se recebo dor, te devolvo amor / E quanto mais dor recebo, mais percebo que sou indestrutível”. No geral, o repertório não se destaca necessariamente pelo conteúdo lírico, na verdade, é o seu ponto mais fraco. No entanto, “Indestrutível” possui uma parcela considerável de profundidade e crueza. Em suma, Pabllo Vittar transita por vários gêneros e diferentes ritmos musicais no decorrer do álbum, a fim de mostrar sua autenticidade e identidade artística. Agora, nos resta aguardar pelo próximo passo da drag queen, diante do sucesso inicial do “Vai Passar Mal”.