Em seu novo álbum, Kali Uchis apresenta baladas exuberantes e um reggaeton efervescente.
Nascida na Virgínia em uma família de imigrantes colombianos, Kali Uchis foi criada tanto nos Estados Unidos quanto na Colômbia. Depois que encontrou seu amor e refúgio na música, passou sua adolescência escrevendo poesia e tocando piano. Ela lançou sua primeira mixtape de graça em 2012. Produzido por ela mesma em seu laptop quando tinha 18 anos, o projeto causou sensação na era dos blogs e nos círculos underground, eventualmente chamando a atenção de nomes como Snoop Dogg e Diplo. Ainda adolescente, ela ficou determinada a economizar dinheiro com seu emprego em um supermercado para se mudar para Los Angeles. No momento em que lançou seu primeiro EP, “Por Vida” (2015), sua ascensão parecia iminente. Seu ponto de virada no mainstream aconteceu em 2017, quando conquistou o público com “Tyrant” e idealizou o irresistível refrão de “See You Again”, de Tyler, the Creator. Depois de receber inúmeros elogios da crítica com o seu álbum de estreia, “Isolation” (2018), ela encontrou maior o sucesso comercial com “telepatía”, faixa do álbum “Sin Miedo (del Amor y Otros Demonios) ∞” (2020).
No vídeo de “Te Mata”, faixa de destaque do seu novo álbum, “ORQUÍDEAS”, Kali Uchis incorpora as crueldades da vida como uma mulher poderosa. O clipe é incrivelmente texturizado com sua paleta de cores vivas e saturadas. Ela se veste com um vestido marfim, incrustado de cristais, joga um telefone sem fio pela janela, empurra garrafas de vidro de uma mesa em um momento de raiva, chora uma única lágrima com um roupão azul-bebê e sutiã de renda com seus olhos emoldurados por cílios penugentos e ri quando uma mão pressiona um revólver em sua testa. “Te Mata” serve como um belo exemplo do seu talento para criar universos recheados de paixão, raiva e tristeza. À medida que ela lançou mais músicas em espanhol nos últimos anos, Uchis afiou sua visão artística. Em “ORQUÍDEAS”, ela escreve outro manual de instruções para mulheres que sentem vontade de enfiar ex-namorados tóxicos no porta-malas de seus carros e passar o dia com espartilhos vermelhos brilhantes e saltos plataforma. Mas o álbum também é um reflexo da amplitude da música latina.
Apesar do recente sucesso comercial de artistas de ascendência latino-americana, muitos empresários da indústria ainda acham difícil que uma cantora possa prosperar fazendo música em espanhol. Como Selena Quintanilla e Shakira antes dela, Kali Uchis prova que eles estão errados. Boa parte do álbum reprisa os devaneios reluzentes pelos quais ela é conhecida, ostentando harmonias e arpejos de sintetizador. “Young, Rich & in Love”, “Diosa” e “Perdiste” foram certamente projetadas para tocar enquanto você se banha em uma banheira cheias de pétalas de rosa. “Heladito” é um lindo retorno à forma; aqui, os fãs provavelmente reconhecerão a sensibilidade melódica do EP “Por Vida” (2015). O primeiro terço do álbum é tão uniformemente luxuoso que as músicas são quase difíceis de distinguir. Mas o synth-pop “Igual Que Un Ángel”, com Peso Pluma, é uma exceção, levando em consideração o seu refrão angelical. Sobre uma linha de baixo e carrilhões, eles cantam sobre uma mulher que nunca se rende a um amor superficial – o tom nasal de Pluma se mistura facilmente ao ritmo.
A performance vocal de Uchis também representa uma melhora: há 12 anos, ela possuía uma amplitude vocal mais limitada. Agora, ela estica sua voz até um registro tremulante em “¿Cómo Así?”. Quando ela mergulha nos idiomas latino-americanos, se torna imparável; Para “Te Mata”, a colombiana-americana retorna ao bolero depois de explorá-lo em álbuns anteriores. Cantoras de bolero foram enraizadas na memória cultural como divas histéricas, mas com “Te Mata”, Uchis se junta a uma onda crescente de artistas reinterpretando o formato como uma expressão de poder. Sobre uma guitarra espanhola e arranjos de cordas, Uchis canta sobre ser representada como a “diabla” na história de um parceiro egoísta, apenas para perceber que ela está muito melhor sem ele. Embora Uchis não seja tão poderosa vocalmente, sua performance ainda é linda e ardente. Ela consegue canalizar a desesperança ferida e a liberdade duramente conquistada pelas mulheres. Construído com um instrumental de dembow, “Muñekita” apresenta 3 minutos e meio de perreo, alimentado pelos ronronados felinos de Kali, a explosão de El Alfa e o fluxo impressionante de JT.
“Labios Mordidos”, que apresenta a compatriota Karol G, é uma ode a uma deusa; Seus vocais são ásperos, seus gemidos são orgasmicos e suas letras são diabolicamente astutas. As incursões em novos gêneros também são interessantes. “No Hay Ley Parte 2”, uma atualização do single de 2022, trabalha sob um dembow lascivo e um house dos anos 90, cortesia de Tainy, El Guincho, Jam City, Ovy on the Drums e Geeneus. Essa versão também inclui um verso do porto-riquenho Rauw Alejandro; seu lirismo sujo é um acompanhamento adequado para o refrão descontraído de Kali Uchis. Junto com a percussão de reggaeton, ela eleva “No Hay Ley” a um novo pico de felicidade. Em “Dame Beso // Muévete”, Uchis se entrega ao merengue dos anos 90. Fiel à forma, ela coloca seu próprio prazer no centro da música. Na metade do caminho, a banda ainda acelera o ritmo – um truque inesperado para uma despedida exuberante. Kali Uchis construiu o repertório com histórias sedutoras e angustiantes, fantasias onde mulheres podem ser tão ruins quanto ternas. Mas especificamente em “Me Pongo Loca”, ela esclarece essa verdade nua e crua: “Eu digo que não me importo com nada / Mas também não sou feita de gelo”.